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Quando você pensa em uma criança, qual imagem vem à sua cabeça? Normalmente as imaginamos sorridentes e alegres, fazendo estripulias por aí. Mas por trás das risadas infantis, um problema considerado de adulto se esconde.
Estima-se que o número de crianças que enfrentam transtornos mentais no Brasil pode chegar em até 20%, dependendo da região do país. A conclusão é de uma pesquisa de 2014 da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) , em São Paulo. Com a pandemia, os casos de ansiedade e demais desequilíbrios emocionais na infância aumentaram.
Ainda há poucas estatísticas sobre a prevalência de transtornos mentais entre crianças, porém as porcentagens já se materializam no ambiente escolar. Mesmo em tempos de ensino híbrido, professores devem ficar atentos a sinais de desequilíbrio emocional entre os alunos e, principalmente, saber como ajudar.
Neste artigo, você encontrará os primeiros passos para falar sobre saúde mental na escola com seus alunos, além de entender o que o professor deve fazer (e o que não fazer) ao identificar sinais de desequilíbrio emocional.
Este conteúdo foi baseado no livro “Saúde mental na escola: o que os educadores devem saber” (2014), organizado por Gustavo M. Estanislau e Rodrigo Affonseca Bressan.
Com a universalização da educação básica no Brasil, a escola se tornou o espaço em que crianças e adolescentes passam a maior parte dos seus dias. É neste ambiente que eles aprendem não somente matemática, português e biologia, mas também habilidades sociocomportamentais que usarão ao longo da vida. Neste sentido, a aprendizagem e o comportamento não podem ser dissociados da saúde mental, que tampouco deve ser vista como algo separado da saúde física.
A prevenção e promoção da saúde estão previstas na Constituição de 1988, que também considera a escola como um lugar propício para estas ações. Ainda, ela é mais acessível à comunidade do que os serviços de saúde mental, além de ser considerada mais acolhedora por alunos e familiares para tratar destas questões.
O acolhimento é essencial para vencer o estigma relacionado à saúde mental. O primeiro passo é criar um espaço de troca de experiências entre os pares, para que o estudante não se sinta diferente dos demais por experienciar algum quadro de desequilíbrio emocional. Ele precisa saber que existem outros colegas passando por situações semelhantes. Os estudantes também devem sentir confiança para procurar ajuda nos serviços de orientação educacional de cada escola, que deverá fazer os encaminhamentos necessários para o início do processo de diagnóstico e tratamento.
Ações de intervenção de saúde mental na escola são uma alternativa às políticas punitivas, ainda disseminadas em instituições de ensino de todo o país. Intervenções de saúde comportamental positiva trazem melhorias no comportamento relacionado a desempenho acadêmico, segundo estudo de 2014 do Centro de Saúde e Cuidados de Saúde nas Escolas (School-based health center, em inglês), nos Estados Unidos.
Por isso casos de indisciplina ou comportamento inadequado devem ser abordados com práticas que produzam um efeito de aprendizagem social e emocional. As redes estaduais que são referência neste quesito são a Secretaria de Estado de Educação do Amazonas (Seduc-AM) e a Secretaria da Educação do Rio Grande do Sul (Seduc-RS).
A partir da criação da Coordenação de Atenção Psicossocial, em 2019, a Seduc-AM montou uma equipe interdisciplinar dedicada à promoção da saúde mental nas escolas do estado. Psicólogos, assistentes sociais e pedagogos orientam programas e projetos educacionais voltados à saúde, tanto de alunos quanto de professores.
Mais recentemente, durante a pandemia, a rede amazonense promove em Manaus o Programa de Desenvolvimento Socioemocional Learn to Fly, que oferece teleconsultas individuais e coletivas com psicólogos e pedagogos aos estudantes. Participaram do programa estudantes que já haviam dados sinais de desequilíbrio emocionais em 2020.
O programa de promoção de saúde mental nas escolas do Rio Grande do Sul é mais antigo. Implantado em 2015, as Comissões Internas de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (Cipave) desenvolvem projetos entre estudantes e professores que abordam a cultura de paz e valores nas instituições de ensino do estado. As dinâmicas de grupo trabalham questões como respeito, autoestima e autocuidado.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e os Parâmetros Curriculares Nacionais, a promoção da saúde acontece por meio da educação, que deve disseminar informações corretas que empoderem o cidadão e a comunidade. Ou seja, é com o conhecimento que as pessoas adotarão um estilo de vida mais saudável, desenvolverão habilidades e capacidades individuais e ainda contribuirão para a produção de um ambiente saudável. Cabe lembrar que a legislação traz uma perspectiva de saúde holística, que não separa a física da mental nem se concentra apenas na doença.
Pela lei, a saúde é um tema transversal no currículo escolar, conforme os princípios estabelecidos pela OMS na década de 1980. As diretrizes das escolas promotoras de saúde segundo a entidade internacional são:
Mais recentemente, um projeto de lei em discussão no Congresso Nacional propõe a criação de uma semana dedicada à saúde mental nas escolas de educação básica das redes pública e privadas. A proposta é que cada instituição de ensino realize palestras, debates e atividades lúdicas ao longo de uma semana de sua escolha.
Isso não significa que, ao falar sobre saúde mental na escola, a instituição de ensino se converta em uma clínica terapêutica ou o professor tenha que se tornar um psicólogo. O principal papel dos educadores ao abordar o assunto é compartilhar informações confiáveis e descontruir os estigmas , frisando que transtornos mentais como depressão e ansiedade não são "frescura".
Pelo fato de a escola não ter o objetivo de ser uma clínica, a intersetorialidade entre os sistemas públicos de saúde e de educação é tão importante para promover a saúde mental. No Brasil, este modelo de trabalho está previsto na Portaria 3.088/2011, que criou a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Antes da instituição da RAPS, já haviam sido instituídos em 2002 os Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis (CAPSij), serviço de saúde voltado a crianças e adolescentes que sofrem com comprometimentos emocionais e psíquicos.
Artigo científico publicado em 2019 sobre a intersetorialidade e cuidado em saúde mental mostrou que, na região Sudeste, os serviços públicos que mais encaminham crianças e adolescentes para os CAPSij são as escolas municipais e estaduais. Os pesquisadores também levantaram os principais benefícios da intersetorialidade com 35 centros, listados abaixo:
É importante que toda escolha mantenha uma lista atualizada dos contatos dos CAPS e dos CAPSij de sua região, para, quando necessário, acionar as equipes multidisciplinares dos centros e fazer os encaminhamentos adequados.
Além de transmitir informações confiáveis sobre saúde mental na escola e desconstruir estigmas, o educador deve entender que ele é um grande ajudante na identificação de sinais de problemas emocionais, devido às características do seu trabalho em sala de aula:
O professor não é responsável por fazer um diagnóstico (e nem deve), mas sim por falar sobre saúde mental na escola seguindo estas orientações, presentes no livro “Saúde mental na escola: o que os educadores devem saber”:
O professor deve observar as seguintes características dos alunos para auxiliar psiquiatras, psicólogos e fonoaudiólogos a definir um diagnóstico e tratamento:
Geralmente, a definição do diagnóstico é feita por uma equipe multidisciplinar, que avalia o caso do estudante a partir de entrevistas com pais e professores, além de observar a criança no consultório.
É fundamental que o professor não se sinta sobrecarregado nem pressionado a intervir quando identificar algum desequilíbrio emocional em um aluno. O educador já estará ajudando-o ao passar a informação para a equipe pedagógica ou fazer o encaminhamento do caso para o atendimento especializado.
Por okleina
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